quarta-feira, 21 de abril de 2010

O Sempre e o Nunca...

Se tu existisses, seria bem diferente esta tarde de sábado. Esta tarde cinzenta de chuva e vento a bater nas minhas janelas.
Estaríamos juntos nesta casa. Eu a escrever porventura uma prosa diferente. Tu a seleccionar a música e a mudá-la cada vez que chegasse ao fim. Ou à procura, num de muitos livros, das palavras adequadas ao momento. Ou eu me levantaria, a sossegar por segundos a ansiedade da escrita, e chegaria junto de ti e acariciaria o teu rosto. Tu fecharias os olhos e os meus dedos percorreriam cada ruga, cada linha, cada ângulo da tua face, o ricto do teu sorrir. Ou serias tu que pararias por trás da minha cadeira e as tuas mãos falariam com os meus cabelos e os teus braços apertariam mansamente o meu peito.
O mais importante viria sempre ao entardecer. Sem palavras sairíamos juntos a calcorrear ruas e passeios de mão dada. E o aperto da tua mão sobre a minha seria mais forte sempre que eu vacilasse. E a luz do teu olhar seria mais doce sempre que por nós passasse uma criança. A única fala seria a tua pergunta e a minha resposta, ambas já sabidas mas sempre repetidas:
- Vamos dançar?
- Vamos dançar.
Depois viria música, muita música, forte e suave. Não sei onde dançávamos, talvez ao longo dos espaços da nossa fantasia feitos de campos de relva enfeitados a papoilas. E ficaria sempre connosco a plenitude da vida. Às vezes dançávamos "As Time Goes By”. De acordo, revivíamos, como capítulos de ficção, a nossa meninice, a nossa juventude, por fim a nossa velhice – os tempos do presente feitos de pedacinhos concretos e intactos do passado.
Noite velha, regressaríamos a casa. Cansados mas repletos, adormeceríamos num abraço. E eu não queria nunca mais acordar, porque sempre, ao acordar, tu nunca estás.

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