quinta-feira, 29 de abril de 2010

MOMENTO

No mar das tuas mãos
me fiz batel
Na luz do teu olhar
me fiz farol

No calor da tua pele
matei o frio
de um porvir
a que roubaste o sol.

terça-feira, 27 de abril de 2010

DA VIDA E DA MORTE

DA VIDA
Porque viver
pode ser,
apenas,
desaguar
neste rio que me abraça,
todos os dias,
ao amanhecer.

E DA MORTE
Porque morrer
pode ser,
apenas,
um sereno empalidecer
nas estrelas
de cada por-do-sol.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

ALEGORIA

O teu corpo é uma praia
que se espraia
no tempo improvável das paixões

O teu rosto é um astro incandescente
que me queima
no braseiro implacável das memórias.

domingo, 25 de abril de 2010

Fé...

Entrar na Tua casa
Senhor
Falar... Falar... Falar
baixinho ao Teu ouvido.

Recolher o Teu sorriso
e sair com a alma apaziguada.

sábado, 24 de abril de 2010

A Carta

(Embora escrita em pleno Verão, esta carta é na verdade o mais belo cartão de Natal.)

Avó
Tu és muito minha amiga. Tenho pena de estares sempre muito só, mas vou-te arranjar um companheiro. Se quiseres, empresto-te um peluche do meu quarto. Eu sei que tu gostas deles. Outro dia, vi numa revista do Pai um felino electrónico. Também era giro, miava, andava, comia biscoitos e fazia xixi. Vou ver se descubro onde é que o Pai guardou essa revista.
Beijinho do teu neto
Francisco Limão

Agosto de 2006

O Pão por Deus

Era o Dia do Pão por Deus. Como de costume, o Francisco telefonou-me, logo de manhã, no dia 1 de Novembro:

- Avó, já bateram à tua porta a pedir o pão por Deus?

- Não, meu amor, ainda não tocou ninguém.

- Então tem cuidado, Vó. Tu podes estar sozinha. Sabes, às vezes, os ladrões metem um pé-de-cabra na porta e conseguem abrir...

- Não tenhas receio, meu amor. Eu tenho ali uma pistola,dou um tiro no pé-de-cabra e eles desatam a fugir...

- Oh! Avó, és uma velhota rara!

(Fiquei contente com a conclusão. Mas aqui entre nós, confesso ainda hoje me pergunto se o meu rapaz não quereria chamar-me “avis rara”...)

quarta-feira, 21 de abril de 2010

O Sempre e o Nunca...

Se tu existisses, seria bem diferente esta tarde de sábado. Esta tarde cinzenta de chuva e vento a bater nas minhas janelas.
Estaríamos juntos nesta casa. Eu a escrever porventura uma prosa diferente. Tu a seleccionar a música e a mudá-la cada vez que chegasse ao fim. Ou à procura, num de muitos livros, das palavras adequadas ao momento. Ou eu me levantaria, a sossegar por segundos a ansiedade da escrita, e chegaria junto de ti e acariciaria o teu rosto. Tu fecharias os olhos e os meus dedos percorreriam cada ruga, cada linha, cada ângulo da tua face, o ricto do teu sorrir. Ou serias tu que pararias por trás da minha cadeira e as tuas mãos falariam com os meus cabelos e os teus braços apertariam mansamente o meu peito.
O mais importante viria sempre ao entardecer. Sem palavras sairíamos juntos a calcorrear ruas e passeios de mão dada. E o aperto da tua mão sobre a minha seria mais forte sempre que eu vacilasse. E a luz do teu olhar seria mais doce sempre que por nós passasse uma criança. A única fala seria a tua pergunta e a minha resposta, ambas já sabidas mas sempre repetidas:
- Vamos dançar?
- Vamos dançar.
Depois viria música, muita música, forte e suave. Não sei onde dançávamos, talvez ao longo dos espaços da nossa fantasia feitos de campos de relva enfeitados a papoilas. E ficaria sempre connosco a plenitude da vida. Às vezes dançávamos "As Time Goes By”. De acordo, revivíamos, como capítulos de ficção, a nossa meninice, a nossa juventude, por fim a nossa velhice – os tempos do presente feitos de pedacinhos concretos e intactos do passado.
Noite velha, regressaríamos a casa. Cansados mas repletos, adormeceríamos num abraço. E eu não queria nunca mais acordar, porque sempre, ao acordar, tu nunca estás.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Viagem

Com estas palavras
percorro
as margens de um rio.

O latejar suspeito
de um vulcão cansado.

Os terraços geométricos
dos arranha-céus da cidade.

Com estas palavras percorro
nas praias revoltas do meu ser

as ondas inquietas do teu rosto...

Escrever

Escrever.
Escrever.
Sentir que
docemente
tudo volta ao seu lugar.

domingo, 18 de abril de 2010

Paixão...

Tanto te procuro
que te hei-de encontrar.
Num abraço profundo
numa noite sem bruma.
À beira do mar...
Não podes impedir que os pássaros da iniquidade voem sobre a tua cabeça mas podes evitar que façam os ninhos no teu cabelo...